Por Pedro Bacelar de Vasconcelos
Há cerca de um ano escrevia nesta coluna – no dia da tomada de posse do Governo que agora cumpre o seu 1.º aniversário – que o “Governo que hoje inicia funções é um Governo de combate. É uma equipa coesa e empenhada na concretização do seu programa”, integrada por gente que esteve “envolvida na sua conceção” e que também participou “na construção dos indispensáveis consensos com os partidos políticos que vão garantir, no Parlamento, a maioria necessária para conduzir a bom porto o projeto político em que se traduz esta viragem histórica. Uma tarefa, enfim, que terá de ser cumprida e inteligentemente articulada em duas frentes distintas: na prática governativa e no trabalho parlamentar”.
Verificamos hoje que esta aposta está ganha. Que uma nova prática parlamentar foi inaugurada por esta aliança parlamentar onde a lealdade entre os parceiros se pauta pelos compromissos assumidos sem prejuízo da diversidade de projetos e ideários em que se funda a identidade dos quatro partidos da nova maioria. E que daí resultou uma transparência inédita que respeita as promessas que cada um assumiu perante os seus eleitores e simultaneamente resgata o Parlamento do descrédito a que a ilimitada demagogia da governação do PSD/CDS o tinha condenado. Sobre os ombros de António Costa recaiu “a responsabilidade de concretizar a promessa pela qual se bateram todas as forças políticas da Esquerda que apoiam o Governo do PS: o compromisso de inverter o rumo de destruição económica, social, cultural e cívica que a Direita pretendia perpetuar contra a vontade democrática que ficou exuberantemente atestada pelo resultado das eleições para a Assembleia da República”, no dia 4 de outubro de 2015.
Não foi fácil operar essa viragem histórica que teve de enfrentar a desconfiança, o ceticismo e os ressentimentos herdados dos inícios turbulentos da revolução democrática de Abril de 1974. Foram precisos “40 anos para que a Esquerda se reencontrasse”. E, na verdade, tratava-se somente “de reatar uma comum tradição de rebeldia que alimentou a resistência contra a ditadura de Oliveira Salazar e Marcelo Caetano, contra as guerras de África – injustas e inúteis! – contra a subserviência e o medo”, mas também “contra a resignação à fatalidade da pobreza e da ignorância”! Como dizia há um ano, foi um “reencontro que se inspirou nos valores partilhados da liberdade e da igualdade, gravados a fogo na Constituição de Abril”.
E um ano bastou para provar que a liberdade de um povo não é o luxo exclusivo de democracias ricas e prósperas. Com exceção das ditaduras e dos regimes teocráticos, nenhuma força transcendente se pode substituir à vontade dos cidadãos e obrigá-los a seguir por caminhos que não queiram trilhar para um destino que não desejem. Bastou um ano de governação para confirmar que a alternativa política apresentada pelo Partido Socialista dá resposta positiva à mudança política que os eleitores exigiram em outubro do ano passado.
E não se ficam por aqui as lições a retirar do primeiro ano de vigência da aliança parlamentar das esquerdas. Tal como afirmou Carlos César no encerramento do debate parlamentar sobre o Orçamento do Estado de 2017, ficou também demonstrado “que os maus tratos que os portugueses sofreram nos anos do Governo PSD/CDS, não resultavam apenas da aceitação submissa das orientações dos nossos credores, ou dos “erros do Governo anterior”, ou da expiação de termos vivido, como diziam, “acima das nossas possibilidades”! Bem pelo contrário, sublinhou o presidente do Grupo Parlamentar dos socialistas, “ficou demonstrado que pouco mais foram do que a trágica consequência da insensibilidade das doutrinas em que se fundou a governação do PSD e do CDS”.
Contra as incertezas e as más novas que nos chegam de outros lados do Mundo, aqui inscrevemos um exemplo de coragem e um sinal de esperança.
Artigo publicado no Jornal de Notícias, dezembro 2016