Três questões essenciais

Três questões essenciais

 

Por Pedro Bacelar de Vasconcelos

Deputado eleito pelo PS e professor de Direito Constitucional

 

Faltam apenas dois meses para as eleições legislativas. Todas as forças políticas apresentaram já os programas com que irão disputar as preferências dos cidadãos eleitores.

É por isso o momento oportuno para ponderar o alcance e as consequências das mudanças que, de modo mais patente ou subterrâneo, têm vindo a introduzir uma crescente perturbação no tradicional funcionamento das sociedades democráticas. Uma perturbação que, apesar da diversidade das suas manifestações, é também visível entre nós. É assim possível reconduzir estas mudanças a três tópicos problemáticos que reclamam a mais séria ponderação no âmbito da política interna e das relações internacionais: os partidos políticos, a justiça e a paz.

Em primeiro lugar, face à crise dos modelos de representação democrática, os partidos políticos estão obrigados a repensar os termos da sua contribuição “para a organização e (…) expressão da vontade popular”, conforme determina o n.º 2 do artigo 10º da Constituição. A sua estrutura e funcionamento tem de se adaptar a critérios de transparência mais exigentes, maior abertura e mais oportunidades de participação dos não filiados. A fragmentação do sistema partidário, como indica Pedro Adão e Silva em publicação recente, é hoje uma tendência generalizada que recomenda o reforço da cooperação e convergência entre diferentes forças políticas para o exercício da governação.

Em segundo, há que reconhecer a persistência entre os magistrados judicias e do Ministério Público de uma cultura obsoleta, alheia ao fenómeno da normalização da interferência judicial em áreas que outrora constituíam domínio exclusivo do poder político e da administração pública. Nenhum setor relevante da vida social escapa hoje ao escrutínio da justiça. Por isso mesmo, a sua independência e autonomia têm agora de ser garantidas não só contra o poder político e os grupos económicos, como no passado, mas também contra as suas próprias organizações sindicais e inevitáveis tentações corporativas. Com efeito, a independência dos tribunais não é uma prerrogativa dos magistrados. É um princípio fundamental do Estado de direito.

Por último, a violência, a impiedade e o arbítrio exibem-se com despudorada impunidade nas relações internacionais e alcançaram uma expressão mediática escandalosa, diretamente proporcional à notória decadência das referências geoestratégicas que no passado ordenaram o Mundo. É superior obrigação dos estados respeitar e impor o respeito pelo direito internacional, promover a solidariedade e a cooperação entre os povos e reconhecer na construção da paz a causa mais urgente da Humanidade.

 

Artigo publicado no Jornal de Notícias, agosto de 2019

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