O franchising dos CTT

O franchising dos CTT

Por Nelson Oliveira, dirigente socialista

 

Os CTT anunciaram a intenção de encerrarem 22 postos de atendimento, no seguimento de um plano de reestruturação da empresa que prevê o despedimento de 800 pessoas durante os próximos três anos.

Este é mais um passo da estratégia empresarial dos CTT – Correios de Portugal, S.A., que visa, tão-somente, melhorar os lucros e diminuir as despesas em balcões/serviços alegadamente deficitários. A isto, nada contra, uma vez que esta empresa é atualmente 100% privada e a sua gestão depende exclusivamente da sua estrutura acionista (Gestmin, SGPS, S.A.; Global Portfolio Investments, S.L.; Credit Suisse Group AG; Norges Bank; BNP Paribas Asset Management, S.A.; Wellington Management Group LLP; Kairos Partners SGR SpA e restantes acionistas).

A única questão que neste momento se impõe é que os CTT foram desde tempos imemoriais, uma das garantias do que se pode chamar serviço público. Um serviço de proximidade, que mantinha os cidadãos em contacto com qualquer parte do país e do mundo e que servia também para que os mais idosos, entre outras tarefas, pudessem proceder ao levantamento da sua pensão.

Apesar da evolução e informatização da sociedade, os CTT souberam remodelar o seu foco de negócio e, em 2014, com a presença do Estado na sua estrutura acionista, os CTT obtiveram lucros de 77,2 milhões de euros. Após a privatização total da empresa em finais de 2014, onde o Estado vendeu a participação de 31,5% da Parpública, os lucros começaram a cair até ao presente ano – o que levou a esta tomada de posição do Conselho de Administração.

É certo que há empresas públicas que dão prejuízo e empresas privadas que prestam serviços públicos de excelência, mas neste caso, uma vez mais, vimos o Estado prescindir de uma empresa que gerava lucros e que agora, o serviço começa a ser descaracterizado, penalizado e de difícil acesso às populações do interior.

No seguimento de todos estes acontecimentos, os CTT procedem à velha tática do caos e chantagem junto das populações e seus representantes, anunciando o encerramento de balcões e levando a que seja as autarquias a agir, de forma voluntariosa, célere e defendendo o superior interesse da população.

Esta estratégia é usada há muito tempo e, na esmagadora maioria das vezes, com resultados bastante positivos para o agente económico que face à necessidade da população e contestação pública, vê as autarquias assumirem parte dos custos de manutenção de um serviço privado que nunca deveria ter saído da esfera pública.

Constitui-se assim, aos poucos, uma espécie de Franchising deficitário para o franqueador, onde o poder local assume paulatinamente os serviços essenciais da população sem daí tirar qualquer lucro – sendo possível que a longo prazo a situação se torne insustentável financeiramente para as Juntas de Freguesia.

Nesta última semana vimos a Junta de Freguesia de Freamunde e Penafiel assumirem posições para que os serviços de Correio não saiam destas localidades, avocando previsivelmente encargos para a manutenção dos CTT, tal como já havia acontecido na freguesia de Gandra (Paredes).

Não sou apologista da intervenção desmesurada do Estado na vida empresarial. Não me choca que os empresários e acionistas procurem o máximo de lucro, mas o Estado tem a obrigação de precaver estas situações para que serviços fundamentais à população não sejam privatizados ou estejam dependentes do esforço das autarquias que já substituem o Estado central em muitas áreas sem a respetiva comparticipação financeira.

É chegada a altura das entidades centrais e governamentais entenderem que se nada for feito este tipo de estratégias vão continuar. Estratégias legítimas por parte dos acionistas, mas que lesam o Estado uma vez que é o dinheiro dos contribuintes que paga a ausência de serviços públicos que nunca deveriam deixar de o ter sido.

 

Artigo publicado no Jornal TVS – Terras do Vale do Sousa

 

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